Por Rebecca Santoro
19 de março de 2009
Leia a íntegra do voto-vista do Ministro Marco Aurélio Mello
Diz o ditado que 'em terra de cego, quem tem olho é rei'. Menos aqui 'nesthe paísth'. Por aqui, quem tem olhos, ouvidos e boca, todos funcionando muito bem, para enxergar, ouvir e dizer a verdade, é tratado com desdém, como alguém a quem não se deva dar ouvidos posto que, provavelmente, seja do tipo que possua mania de perseguição, do tipo que veja chifre em cobra.
Bem, assim tem sido no tratamento de inúmeras e sérias questões de interesse nacional. E não foi diferente no caso da decisão em relação à legalidade no caso da demarcação da reserva indígena Raposa - Terra do Sol em terras contínuas, finalmente, findado o julgamento no Superior Tribunal Federal (STF), ontem e hoje (19/03/2009).
Durante o processo de discussão nacional a respeito do tema, incontáveis artigos e reportagens jornalísticas apontaram os riscos, as possíveis ilegalidades (cometidas e a serem cometidas) e as prováveis injustiças que poderiam advir no caso de a reserva permanecer homologada de forma contínua, como assim o desejava o governo de FHC e continuou desejando, digamos, ardentemente, o governo Lula. Experimentaram fazer na marra, mas viram que a crise seria grande, de forma que optaram por amolecer a resistência dos contrários à demarcação contínua utilizando-se de recursos de 'legalidades'. Ganharam tempo e, gramscinianamente, conseguiram realizar o isolamento das terras que sempre souberam que seria realizado.
Na hora derradeira, ou seja, no julgamento final da questão pelo STF, última instância judicial a que se possa recorrer, o único ministro – o único - daquela casa que foi capaz de dizer todas as verdades que precisariam ser ditas naquele tribunal a respeito do tema foi Marco Aurélio Mello. Ele, que havia pedido vistas em sessão anterior, fez um voto-vista longo, completo, irretocável e corajoso em defesa do Brasil – tendo provocado, inclusive, após seu voto, uma espécie de justificativa do ministro Ayres Britto por não ter dado voto nada parecido (clique no quadro ao lado e leia parte da discussão). Marco Aurélio humilhou todos os colegas pela precisão e veracidade de seu voto. Mas, como sempre se soube, nenhum deles modificou o voto já dado. Apegaram-se à bengala dos 18 itens a serem respeitados em concessões de terras indígenas apresentados pelo ministro Celso de Melo em seu voto.
Como se não bastassem todas as questões de ordem 'subjetiva', como as de conceito de segurança nacional, de provável e futura falência do Estado de Roraima, etc., Marco Aurélio provou, incontestavelmente, a inconstitucionalidade da ação da União, no sentido da homologação das terras da reserva em contínuas, uma vez que baseada e justificada em dados fornecidos por apenas um dos lados interessados na questão (o dos que defedem a demarcação em terras contínuas). O Ministro recomendou que o processo inteiro de demarcação daquelas terras fosse reiniciado, dessa vez, com a participação de todos os interessados.
De nada adiantaram os esclarecimentos do Ministro, as reportagens de alerta e os artigos bem elaborados tratando da questão – sob diversos pontos de vista. "A parede é verde, todo mundo vê que é verde; mas, os ministros do STF e o governo decidiram que devemos todos observa-la como se outra cor qualquer tivesse".
O 'pacote' de 18 medidas (leia no post abaixo), que acabaram por se transformar em
Ou seja, ou nada disso pretende realmente ser cumprido por tribo indígena nenhuma – e muito menos fiscalizada por governo nenhum - ou de nada adiantou a tomada das terras, porque não foi para viver como seres primitivos isolados que os índios lutaram (com a ajuda biliardária de poderosas Ongs internacionais) para ficar com uma imensidão de terras riquíssimas como as que compõem o solo da Raposa – Serra do Sol.
Uma coisa é certa: se alguma das nefastas previsões para a região se concretizar – seja a da desgraça da fome, da separação das famílias compostas por índios e não-índios, seja a de ocupação da região por guerrilhas, seja a instalação do roubo sistemático de riquezas de diversas naturezas; de quem irão os brasileiros cobrar explicações e justiça? Dos ministros do STF, na porta de suas casas? Das autoridades máximas do Executivo, na porta de suas casas? Na porta dos quartéis das FFAA? Quando tudo é uma farsa; quando a Justiça é uma farsa, a quem ou a o quê mais se pode recorrer?
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