'Hoje, servir na Amazônia é questão de escolha e não castigo como outrora. Nossos melhores profissionais passam por aqui, dando o máximo de si'
'Usamos um fuzil que tem 43 anos. Existe a intenção de começar a raciocinar com o conceito de soldado do futuro, que usa equipagem leve e permite tecnologias sofisticadas'
O comandante militar da Amazônia, general Augusto Heleno Ribeiro Pereira – general-de-Exercito, de quatro estrelas, o único brasileiro na atualidade com experiência em combate, o que aconteceu no Haiti, comandando o contingente da ONU -, voltou a falar.
No começo do ano, quando criticou com veemência a política indigenista do governo federal, no caso da reserva indígena Raposa Serra do Sol, ele chamou a atenção do País ao afirmar aos empresários paulistas, em palestra na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo: 'Não vou entrar para a história como o comandante que foi conivente com a perda de parte do território nacional. Para mim, soberania e integridade do patrimônio nacional não têm discussão. Enquanto eu for comandante militar, minha tropa vai entrar onde for necessário'.
Maior comando do mundo
O CMA, sediado em Manaus, é o maior comando militar em área de selva do mundo e o de maior extensão territorial da América Latina. Está situado numa região de constante tensão. No panorama externo, é onde o Brasil faz fronteira com sete países, onde há forte presença de guerrilheiros, tráfico internacional de drogas, crimes ambientais, biopirataria e a cobiça internacional. No seu interior, a preocupação maior é com a agitação provocada pelos movimentos sociais e questão indigenista, que por vezes promovem ações e discussões que colocam em risco a segurança e a soberania territorial.
Sendo o comando de área com maior expressão nacional, o CMA envolve seis estados e parte de outros dois, numa área de responsabilidade operacional de 3 milhões e 600 mil km², reunindo um efetivo de 25 mil militares, com previsão de chegar a 28 mil com a instalação de três novos batalhões. O general Heleno foi, em 2004, o primeiro comandante da força militar da Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti. Polêmico ao criticar abertamente a política indigenista do Brasil, ele é hoje um dos militares mais admirados na caserna e fora dela.
Efetivo está sendo ampliado
Em entrevista agora publicada no site
www.defesanet.com.br , concedida ao jornalista Kaiser Konrad, o general Heleno, como se tornou mais conhecido, revela que o efetivo militar na Amazônia está sendo ampliado:
'Já tivemos três brigadas transferidas para o CMA (Comando Militar da Amazônia). A mais antiga saiu de Petrópolis-RJ para Boa Vista, é a 1ª Brigada de Infantaria de Selva. A 2º Brigada de Infantaria de Selva, que saiu de Niterói-RJ, está sediada em São Gabriel da Cachoeira, e a Brigada das Missões, que tinha sede em Santo Ângelo-RS, foi para Teffé. Essas brigadas foram resultado de um esforço enorme do Exército para transferi-las à área amazônica, devido à crescente importância da região e a diminuição da importância estratégica em outras regiões do País'.
Fuzis já estão com 43 anos de uso
O general Heleno se refere à necessidade premente de novos equipamentos para sua tropa, inclusive relacionando o que considera mais necessário:
'Se nós verificarmos os nossos sistemas de armas, podemos começar pelo equipamento de uso individual, que precisa ser reformulado e onde temos sérias deficiências. Usamos um fuzil que tem 43 anos. Existe a intenção de começar a raciocinar com o conceito de soldado do futuro, que usa uma equipagem leve e permite ao combatente acessar tecnologias sofisticadas. Se pensarmos em termos de artilharia antiaérea, nós temos muita coisa a acrescentar neste teatro de operações, assim como na artilharia de campanha. Devemos buscar também uma melhora considerável no sistema de armamento anticarro'.
Novos helicópteros logo
O comandante Militar da Amazônia continua:
'No caso na Amazônia, raciocinando que, na guerra moderna, além da dissuasão, a estratégia mais importante é a da projeção de poder, a capacidade de colocar a força desejada no local escolhido dentro do menor tempo possível. Quando se fala nisso, ainda que vulnerável, a plataforma de combate necessária é o helicóptero. Obviamente os helicópteros de ataque são prioritários e eu os quero aqui com urgência.
Existe um estudo ao nível do Comando do Exército e Ministério da Defesa sobre a aquisição de aviões de comando e controle capazes de atender a determinados níveis de comando e que nos dariam uma mobilidade maior dentro de nossa área de atuação. Sobre outras aeronaves, entendo que o poder aeroespacial é responsabilidade da Força Aérea Brasileira e não queremos nada que possa interferir nas missões dela'.
Cobiça internacional, grande ameaça
Para o general Heleno, a grande ameaça à integridade da Amazônia brasileira está na cobiça internacional, devido às sua potencialidades fantásticas em termos de riquezas naturais:
'A cobiça internacional não é uma paranóia dos militares. Ela tem sido expressa nos discursos de autoridades de diferentes países, o que reflete uma cobiça que não é explícita e não tem endereço ainda, mas é genérica. No momento que verificamos o potencial da Amazônia, tudo que ela já mostrou que tem e o que ainda não foi prospectado mas sabemos existir, tudo isso faz com que devemos nos prevenir contra esta cobiça internacional. A conquista desses objetivos extra-territoriais poderá ser atingida sem guerra, subreptíciamente, por ações políticas e de infiltração e, de repente, poderemos nos deparar com um cenário aonde já temos muita coisa usurpada sem que haja um conflito bélico. Esta é uma questão que nos traz muita preocupação. A presença do Estado brasileiro na região é fundamental para neutralizar quaisquer interesses escusos'.
Possibilidade de guerra, não
Sobre guerra, o general Heleno considera que sua possibilidade 'é remota, embora eu acredite que temos que nos preparar para isso. Se fizermos uma análise do nosso relacionamento com as nações vizinhas,veremos que não temos nenhum problema, somente aqueles que são comuns. Eventualmente há alguma tensão, natural de países livres, independentes e soberanos, que podem ter interesses antagônicos mas que também podem ser resolvidos pelas vias diplomáticas. Com relação a outras potências, que possam vir a se interessar num conflito com o Brasil, também não vejo a curto-prazo esta possibilidade. Tenho dito que seria no mínimo imprudente achar que o Brasil não tenha que respaldar algumas decisões políticas num poder militar compatível com sua estatura estratégica'.
Servir na Amazônia não é mais castigo
O comandante militar da Amazônia preferiu não falar sobre o problema indígena, sobretudo em relação à reserva Raposa Serra do Sol, que continua pendente no Supremo Tribunal Federal:
'Tudo que tinha que falar eu já falei. Algumas providências foram tomadas e vamos caminhar para encontrar uma solução ideal. É um tema polêmico e que tem que ser discutido não por poucos indivíduos, mas por toda a sociedade brasileira'.
Na sua visão, 'a presença militar na Amazônia tem um papel preponderante e sua importância pode ser sentida toda vez que nos afastamos das metrópoles regionais e vamos para as proximidades das fronteiras, onde a presença do Estado diminui, e a do Exército, com seu Braço Forte e Mão Amiga, aumenta. A FAB realiza há décadas um papel fantástico em proveito das populações desassistidas da região e, a Marinha, que faz um trabalho essencial ao longo da calha dos rios navegáveis. Tenho certeza que esse papel não vai diminuir. O que queremos são parceiros e que eles se façam mais presentes, que é o caso da Polícia Federal, Incra, Ibama, Receita Federal e Funai, para que nos unamos no trabalho em prol da Amazônia'.
Antes de encerrar, o general Heleno falou de seus sentimentos em relação à missão que atualmente desempenha:
'Quero registrar o orgulho e a honra que tenho por ser o comandante militar da Amazônia. Hoje, servir na Amazônia é questão de escolha e não castigo como outrora. Nossos melhores profissionais passam por aqui,dando o máximo de si, pois sabem que esta área é importante para o futuro do Brasil'.
*Jávier Godinho é jornalista do Diário da Manhã de Goiânia e especialista em assuntos da Amazônia
Nenhum comentário:
Postar um comentário