Prezado Merval:
Quis o destino que, em passado recente (2001 a 2005), eu tivesse a oportunidade de prestar, com alguns colegas de profissão, consultoria especializada de Planejamento Estratégico para a Polícia Federal e, através da Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP / MJ), também para Policiais Civis, Militares e Rodoviários, bem como para Bombeiros Militares, das 27 Unidades da Federação - aqui, no bojo do Plano Nacional de Segurança Pública criado por FHC em junho de 2000, em decorrência do triste episódio do Ônibus 174. Posso, pois, afirmar que conheço razoavelmente o assunto que você vem abordando há alguns dias em sua coluna.
Permito-me, assim, discordar frontalmente da idéia que vem sendo levantada, de se "desconstitucionalizar" essa atividade. E lamentavelmente, constato que, mais uma vez, fazemos jus ao apelido de "macaquitos", que nos atribuem nuestros hermanos de Latino América, pois é nas experiências dos EUA que está sendo buscada inspiração para isso. Lembra-me a folclórica frase de Juracy Magalhães - "o que é bom para os Estados Unidos, é bom para o Brasil". Só que, ao imitarmos tudo que vem dos gringos, não levamos em conta que as origens deles são anglo-saxônicas, capitalistas, contratualistas e protestantes, enquanto nós somos latinos, patrimonialistas ibéricos, absolutistas e católicos - como nos ensinam Raymundo Faoro e José Júlio Senna. Podemos tentar durante séculos, que jamais seremos uma Federação (quase uma Confederação!) Republicana Presidencialista como os EUA - vamos continuar sendo um Estado Unitário, em que todos se sujeitam ao poder central de Brasília, onde sempre veremos um "Rei", que tudo pode, porque é disso que gostamos. Esferas estaduais e municipais de poder não têm, para nós, aquele "charme" de qualquer instituição que se intitule "federal" - ah, nosso velho provincianismo, braços dados à nossa multissecular veneração à metrópole...
Resumo da ópera, prezado Merval: não se pode combater o crime sem unidade doutrinária e organizacional, particularmente porque, em que pesem suas diferenças, os criminosos de há muito se articulam em nível nacional, como bem nos tem mostrado a mídia. Ouvi de vários policiais experientes que o Rio de Janeiro é a fonte de tudo, é o espelho - aqui nascem as concepções estratégicas da bandidagem, que são imitadas país afora, com razoável grau de uniformidade, o que derruba o argumento de que, no combate ao crime, se devem respeitar as peculiaridades de cada Estado: os marginais têm unidade doutrinária, Merval. E mais - se a organização, o adestramento e o emprego das Polícias forem descentralizados para os Estados / DF, fatalmente a legislação penal e de Segurança Pública também deverá sê-lo. E aí veremos repetir-se, nessa área, a anarquia que impera há mais de um século no campo tributário, vide as famigeradas guerras do ICMS e das centenas de taxas e contribuições estaduais e municipais que nos infernizam.
Cada Governador / Prefeito, para deixar nome, ganhar votos, agradar amigos e outros propósitos mesquinhos que vicejam entre todos os nossos políticos, aplicará toda a sua "criatividade", contratando "sociólogos" e "defensores de direitos humanos", ao invés de construir presídios - "aqui, no Estado XPTO, fazemos assim". A tão sonhada integração dos bancos de dados policiais jamais ocorrerá, pois veremos repetir-se o fenômeno das ferrovias particulares dos Barões do Café: em cada fazenda, uma bitola ferroviária diferente, de tal forma que o Brasil, que tinha tudo para se integrar por esse meio, é hoje refém de caminhoneiros, de estradas mal conservadas, de combustível e fretes caríssimos, porque os interesses particulares e os apadrinahmentos sempre vencem.
Naturalmente, nossos Governadores abrandarão mais ainda as penas, sob o argumento da "ressocialização" - leia-se deixar brechas para os apaniguados delinqüentes. Para não falarmos nas inevitáveis baboseiras, derivadas de nossa tupinicagem, com as quais o saudoso Sérgio Stanislaw Ponte Preta Porto redigiria dúzias de volumes de seu FeBeaPá. Recordem-se os saiotes para maiôs de misses, a proibição de policiais subirem favelas, a crença de que se pode proibir por decreto a venda e o consumo de álcool, cigarros e outras drogas etc etc etc. Provavelmente haveria Estados "alegres" onde o "liberou geral" imperaria, e outros mais circunspectos, onde seriam implantados trabalhos forçados, bolas de ferro nos tornozelos e até enforcamento.
O problema, Merval, não está no tipo de diploma onde a legislação é definida, mas na vontade política de se pôr côbro à bandalheira generalizada que se enraizou no Brasil.
Quanto ao Sr Luís Eduardo "Elite da Tropa" Soares, se entendesse mesmo de Segurança Pública, não teria sido defenestrado tantas vezes - e tão rapidamente - de todos os cargos que assumiu nessa área, para acabar - quem diria ! - em Hu ! Hu ! Nova Iguaçu.
Mas se, por um lado, lamento sua investida nesse terreno, defendendo algo que, por força de nossos traços culturais, muito provavelmente só nos fará de ridículos perante o mundo, por outro, louvo sua iniciativa de dar a público a atitude retrógrada que nos está sendo imposta pelo PT e seus asseclas, desde que patrocinou, com Fidel, as FARC, ex-montoneros, ex-tupamaros, Sendero Luminoso, trotskistas, MST e outros radicais, a criação do Foro de São Paulo - uma espécie de "V Internacional", surgida em 1990, congregando os órfãos de Marx - Engels -Lenin - Gramsci - Trotsky - Stalin - Mao - Che et caterva, poucos meses depois que o mundo, em 09/11/1989, lançou tudo isso ao lixo da História, junto com o Muro de Berlim, e só o Brasil não viu. E agora, chocado o ovo da serpente, vêm à luz, na América Latina, os filhotes desse anacronismo, trazendo ao mundo aberrações dignas das bestas do Apocalipse, como, por exemplo, a idéia de não se considerar as FARC terroristas - que você admiravelmente condenou.
exatamente a essa esquerda esclerosada, que nos governa, que compete combater o crime; e é precisamente ela que deseja "desconstitucionalizar" a Segurança Pública. Fica a pergunta - afinal, quem é mais bandido?
Aguardemos, Merval. Ou, como Diógenes, usemos uma barrica à guisa de vestimenta, munamo-nos de uma lanterna e saiamos à procura de um homem honesto.
Um abraço,
Postado por MiguelGCF
Editor do Impunidade Vergonha Nacional
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