Para melhor entendimento, respondo dentro do teu texto, antecipando que a resposta estará seguindo com cópia em "Cco" para mais de 500 endereços, cujos titulares deverão, em atendimento ao pedido que aqui faço, repassar para outros tantos endereços.Ainda que estranhes o modo informal do tratamento na segunda pessoa do singular, hás de compreender que, após a desgraça política que acabamos de assistir no Sendo, não há mais espaço para "excelências", "vossas senhorias" e quejandos. Ademais, tu e os teus pares no Senado são servidores do Estado e, por extensão, empregados do povo. São muito bem pagos, para zelar pela coisa pública, pelo bom andamento das instituições republicanas e pela ordem PRINCIPALMENTE A ORDEM MORAL que deve ser o principal atributo nos homens públicos, principalmente em se tratando de Senadores. Que fique, portanto e desde já, bem claro que o relacionamento estabelecido nesta mensagem é de um patrão com um empregado. Tu és o empregado, e eu, como representado, sou o teu patrão. O tratamento naquela pessoa pronominal não tem, por conseguinte, nenhuma conotação desrespeitosa, vez que, antes, é tratamento perfeitamente adequado às condições dispostas acima. Dito isto, vamos às respostas, dentro do teu texto, como já dito:
Razões do meu voto
"Os juízes devem ser homens de Estado. É necessário que saibam discernir o espírito de seu tempo, afrontar obstáculos que é possível vencer e desviar-se da corrente, quando o turbilhão ameaça arrastar, junto com eles mesmos, a soberania da União e a obediência devida a suas leis". Tocqueville
A referência à citação de Alexis de Tocqueville é descabida, senão inoportuna, vez que as circunstâncias que levaram o pensador francês ao fraseado acima nada têm a ver com as de agora, pelo menos naquilo que pretendes. O "turbilhão", ao qual se refere Tocqueville não está na mídia, vez que esta apenas reflete o pensamento do povo mais esclarecido; está dentro do próprio Senado, nos seus vícios, na sua tolerância ao mal, nos interesses que se baseiam em conveniências espúrias. A rigor, a atual situação de descalabro moral, se tem algo a ver com o que Tocqueville dizia, tem no aspecto preventivo do seu discurso, quando nos falava dos riscos daquilo que chamou de "tirania da maioria", em que uma multidão de despreparados, de ineptos, de completos ignorantes acabam por colocar no leme da nação um embuste, e, no poder legislativo, um bando de velhacos, tal como estamos assistindo agora. Votar significa decidir sobre o futuro de uma nação, e esse ato não pode estar ao alcance de ignorantes, que, pensando mais com a barriga do que com a cabeça, acabam virando massa de manobra nas mãos de oportunistas. Ora! Se esse absurdo acaba sendo institucionalizado na obrigação de votar, temos aí o cenário perfeito para transformar a Nação em quintal de interesses escusos.
Se gostas de citações, deves buscar uma que mais se aproxima do quadro sinistro de agora. Eis uma, de Benjamin Constant:
"Não quero cometer nenhum injustiça contra a classe laboriosa (...). Mas as pessoas que a indigência conserva numa eterna dependência e que condena a trabalhos diários não são nem mais esclarecidas do que as crianças, nem mais interessados do que os estrangeiros numa prosperidade nacional da qual eles não conhecem os elementos e da qual só indiretamente partilham as vantagens"
Percebo e compreendo o sentimento da sociedade, que quer a cassação do Senador Renan Calheiros. Ao longo de mais de 100 dias, diante de tudo o que foi publicado, verdade ou não, é natural que seja essa a vontade e a conclusão das pessoas. Trata-se de um julgamento que não apresenta grandes dificuldades, feito ao sabor da percepção dos acontecimentos veiculados pela mídia.
Se, de fato, percebes e compreendes o sentimento da sociedade, tens o indeclinável dever de fazer eco com a vontade popular, porque, na condição de senador, és o representante dessa vontade. Apenas essa percepção e compreensão bastar-te-iam para cumprires o teu dever: o de declarar publicamente o teu voto pela cassação desse cancro moral que teima em permanecer na Casa do Povo.
De minha parte, também seria mais fácil me esconder no voto secreto, como infelizmente tantos fizeram, sem que ninguém sequer soubesse minha posição, ou simplesmente acompanhar o movimento da sociedade e do eleitor, sem preocupar-me com a imprescindível proteção aos direitos e garantias individuais que julgamentos relativos à cassação requerem. Poderia estar, agora, confortavelmente recebendo elogios de todos.
Estás enganado nesse raciocínio imoral, porque não foste votado para te vestires com os trajes dos covardes na ocultação do voto, e, tampouco, para usufruir de conforto. Um cargo público há de ser sempre um desafio, e o Senado não pode ser casa de acomodados.
Não foi essa a minha atitude. Fiz o difícil e o necessário. Naquele momento, eu não era simplesmente um parlamentar, mas um juiz diante de uma decisão que poderia tirar da vida pública por mais de 10 anos um senador eleito com aproximadamente 80% dos votos de seu estado. Tais julgamentos não podem ser fáceis, pois incidem diretamente sobre direitos e garantias individuais.
Esse pulha, que já perdeu a noção de pudor, foi eleito, graças àquele mecanismo de democracia bêbeda. Ele não representa a vontade legítima de ninguém. Ele é apenas o resultado danoso do voto obrigatório, que entrega o País às mãos de currais eleitorais.
Porém, alguns argumentam que o julgamento no Senado é eminentemente político e não precisa ter o rigor e nem o tempo dos julgamentos jurídicos. Não é verdade. É óbvio que todo processo dessa natureza tem como pano de fundo uma disputa política, principalmente quando está em jogo a Presidência da Casa. Essa disputa, no entanto, não deve contaminar o processo. Julgamentos políticos são típicos de ditaduras. Numa democracia, quaisquer julgamentos, principalmente aqueles que incidem sobre os direitos e as garantias individuais, têm de respeitar princípios jurídicos universais, como o do devido processo legal, o do amplo direito à defesa e, acima de tudo, o de que o ônus da prova para além da dúvida razoável cabe ao acusador. São exatamente esses aspectos formais do processo que garantem o respeito aos direitos e garantias individuais e a lisura dos julgamentos. Não fosse desse modo, os julgamentos seriam, aí sim, meras formalidades.
Aqui, no parágrafo acima, dás uma consumada demonstração da tua inépcia como político, ao querer comparar universos de grandezas e medidas diferentes. O julgamento político tem uma importância tal, que não pode, nem de longe, sujeitar-se às inúmeras brechas que sabemos existirem no julgamento jurídico, por onde sempre escapam os mais ladinos. O político deve estar bem ciente dessa diferença, para evitar sempre o envolvimento em provas circunstanciais, como estas em que está mergulhado o facínora Renan Calhorda. Para melhor exemplificar sobre prova circunstancial, vejamos este caso: um sujeito é flagrado em atitude suspeita dentro de um carro com uma menor. A moça é colocada sob vigilância severa, de modo a não ser possível a ocorrência de contato físico com nenhum outro homem. Poucos meses depois, a moça está grávida. O tal sujeito, colocado na condição de suspeito, apresenta um atestado médico de que é estéril. No exame do documento, constata-se que o mesmo é falso. Pois bem: na tua visão exótica de julgamento perfeito, o sujeito é inocente, porque não há como provar que ele e a moça tiveram conjunção carnal. As provas circunstanciais apontam o sujeito como sedutor da moça, mas o Senador Mercadante só aceita a condenação, se o tal elemento assinar confissão de próprio punho.
É esse tipo de político, que pensa dessa forma, que precisamos extirpar do Senado, da Câmara, enfim, da vida política do País.
Coerentemente com esses princípios e preocupado com o desgaste do Senado, defendi na sessão que fosse adiada a decisão, por considerar que não havia ainda no processo provas conclusivas de que os pagamentos à Sra. Mônica Veloso foram feitos pela empreiteira à qual era vinculado o lobista amigo de Renan Calheiros, já que a leitura atenta dos pareceres revelava mais indagações do que certezas. Tampouco havia no processo a tão necessária análise das outras acusações que pesam contra o Renan Calheiros, como seu eventual envolvimento com a compra de emissora de rádio por intermédio de laranjas, a possível intervenção indevida e ilegal em favor da cervejaria Schincariol e o noticiado esquema de beneficiamento de instituição bancária para atuar com créditos consignados. Assim, era impossível, naquele momento e com as informações disponíveis, emitir um juízo de valor conclusivo sobre a culpa do Senador Calheiros.
Não há mais espaço para adiamento algum. As provas circunstanciais são cabais. O calhorda assinou emenda que beneficiou a construtora Mendes Júnior; esteve visitando o canteiro de obras; posteriormente, sua amante é flagrada, recebendo pensão pelas mãos de lobista da construtora; na tentativa de defender-se das acusações de propina, o patife apresenta papelada, carregada de mentiras, erros grosseiros de contabilidade e notas frias. Que mais queres? Queres a confissão assinada de próprio punho? Ora! Tem paciência.
Considerei, por outro lado, que também não era possível inocentá-lo em definitivo, pois há indícios de crime tributário, que só serão configurados após a devida investigação pela Receita Federal. Outra frente de investigação também está em andamento no Ministério Público Federal, já autorizada pelo Supremo Tribunal Federal, que tem demonstrado extremo rigor na análise de processos que envolvam parlamentares.
Deixa de conversa fiada, homem! Todo mundo sabe bem que o STF não pune políticos, porque está amarrado àqueles ditames do julgamento jurídico. Foi por esse caminho do tal julgamento via STF, que o pilantra do Collor se safou e, por conta do curral eleitoral, acabou se elegendo senador.
Ante a impossibilidade do adiamento da decisão, vi-me num dilema ético. O voto "sim" significava a culpa comprovada acima de quaisquer dúvidas e a cassação. O voto "não", por seu turno, significava o reconhecimento de uma inocência ainda em questão e o arquivamento do processo. Optei, dessa maneira, pela abstenção. Portanto, não dei esse voto por falta de convicções, mas porque acreditava e continuo a acreditar que todos os processos abertos no Conselho de Ética devam seguir com rigor, até que se possa fazer um julgamento final e conclusivo sobre todas as acusações. Defendo, inclusive, que o Senador Renan Calheiros deva licenciar-se da Presidência do Senado, de forma a assegurar que os processos transcorram com isenção e sem percalços de qualquer tipo.
Trocando a tua baleba em miúdos, o que quiseste foi atender a gregos e troianos. Mas, por tudo que já leste até agora, já dá para perceberes que foste mal no serviço.
Não foi uma decisão fácil. Tive de abstrair meus interesses políticos e eleitorais e repelir a sedução do aplauso da opinião pública. Tampouco foi uma decisão coletiva, pois, ao contrário do que foi noticiado de forma maliciosa, não solicitei voto a ninguém e respeitei as convicções de todos.
Não há que falar em facilidade ou dificuldade de decisão. Há que falar em comodidade, em conveniência e, por extensão dessas duas, em covardia.
Foi uma decisão difícil e solitária e o meu voto foi o voto do magistrado que busca pesar cuidadosamente todos os aspectos jurídicos do processo na balança da Justiça e que se rege por lógica e tempo obviamente distintos daqueles utilizados pela mídia.
Não votei em ti, até porque não representas o meu Estado; mas os que em ti votaram, pelo menos os mais esclarecidos, votaram para atuares como representante deles, e não para atuares como juiz.
Estou, é certo, pagando um preço político e pessoal caro por ter tomado essa decisão e não peço que concordem com ela. Mas quero que compreendam que foi uma decisão tomada com transparência e com base em princípios e convicções. Poderia, é claro, ter tomado outra decisão com base apenas nas minhas conveniências políticas e eleitorais. Porém, nesse caso, eu teria de pagar um preço terrível: o preço daqueles que votam contra suas convicções.
Isso é conversa para ninar os bois do Renan. Tuas decisões devem se amparar na retidão moral e no clamor popular, tomando por base que a mídia é espelho e não alavanca.
E esse preço, podem acreditar, eu não poderia jamais pagar.
O preço que tens de pagar é bem outro, muito mais pesado: o preço do enfrentamento corajoso contra os imorais; o preço da vigilância sobre o bem público, o preço de pensar, primeiramente, no Brasil, e, por último, em si mesmo.
Senador Aloizio Mercadante.
Anselmo Cordeiro.
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