Fidel e o golpe da revolução
operada por outros meios
"A mitologia da resistência é uma trapaça ideológica
a emprestar a homicidas compulsivos a dignidade
de utopistas. Hoje, os nossos 'cubanófilos' estão
empenhados é em assaltar os cofres. E é bom lembrar:
os ladrões vulgares não desistiram de solapar a democracia"
A semente do mensalão está na pistola com que Che Guevara executou
um guerrilheiro que roubara um pedaço de pão. O dossiê dos aloprados
foi planejado em Sierra Maestra. O aparelhamento do estado e a farra
dos cartões desfilaram com Fidel Castro em Havana, em 1959. Isso é
história de mentalidades, não de nexos pobremente causais. O assalto
ao Erário, à ordem legal e à administração do estado seria apenas a
revolução operada por outros meios. Os criminosos precisam dessa
mitologia para reivindicar seu exclusivismo moral. É coerente que
propagandistas do PT como o arquiteto Oscar Niemeyer, o cantor Chico
Buarque e Frei Betto sejam também embaixadores (i)morais da ditadura
cubana.
Fidel, vê-se, é uma figura marcante na história do Brasil. A
justificativa nada improcedente do golpe militar de 1964 foi impedir
a "cubanização" do país. Figuras que transitam neste governo têm sua
folha corrida ou sua lenda pessoal ligadas à trajetória
do "comandante". José Dirceu, por exemplo, ganhou seu caráter e uma
de suas caras treinando guerrilha na Cuba revolucionária. Há quem
jure que nunca deu um tiro. O sindicalista Luiz Inácio Lula da
Silva, que estreou no anticomunismo, aproximou-se do castrismo por
razões, acredite!, pragmáticas. Derrotados de 64 forneceram ao dito
então "novo sindicalismo" a vértebra política que ele não tinha e
lhe emprestaram aquela mitologia da "resistência". Na versão mítica,
os derrotados do comunismo que voltaram do exílio tentariam
construir o socialismo recorrendo aos instrumentos que a
própria "burguesia" lhes forneceria. Padres de passeata aspergiram
na mistura um pouco da pervertida água benta anticapitalista, e
pronto! Estava criado o PT. Para quê?
As esquerdas, diz um amigo, não têm uma teologia, só uma
demonologia. Ainda não definiram as virtudes pelas quais lutam, mas
têm claros os valores contra os quais conspiram, e o mais importante
de seus alvos é a liberdade. O alemão Karl Marx (1818-1883), pai
intelectual dos comunistas, tinha certa atração pelo demônio - o
próprio filho o chamava de "diabo"; devia ter lá seus motivos. Em
Marx e acólitos, o novo homem se faz da destruição do patrimônio
cultural que herdamos, não de uma nova resposta às demandas geradas
por essa herança. Por isso o marxismo tentou apagar no "cérebro dos
vivos" o "pesadelo das gerações mortas". Eliminar a memória é
condição essencial do totalitarismo. As revoluções e golpes
comunistas sempre foram exímios na destruição de sistemas, mas
incapazes de criar alternativas: caracterizam-se por longos
processos de depuração, expurgos, retratações e purgações
inquisitoriais. Como diria o cubanófilo Chico Buarque, inventaram o
pecado, mas não o perdão.
Claudia Daut/Reuters
Fidel e Dirceu: quem disse que a história os julgará?
Num ambiente em que se articulam "teologia", "demonologia"
e "esquerdas", uma voz autorizada é a de Frei Betto, o mais pio dos
nossos "cubanos", eventualmente ímpio, já que é um religioso. O
homem é de uma coragem moral admirável na amizade que mantém com
Fidel. Em seu convicto repúdio ao inferno capitalista, jamais se
deixou impressionar por execuções sumárias. Como diria Padre Vieira
(1608-1697), a coragem moral é de Betto, mas o risco é dos outros.
Ele já tem seu veredicto: "Não há nenhum sintoma em Cuba de que o
país possa retornar ao capitalismo". Betto esconjura o demônio.
Trata-se da reza macabra habitual: justificar ou ignorar crimes,
sejam fuzilamentos ou mensalões, em nome de amanhãs sorridentes. É o
que tem feito outro renitente apologista do comunismo, Oscar
Niemeyer, com o peso dos seus 100 anos - a União Soviética não
resistiu mais do que 74... Na carta de renúncia, Fidel citou o
arquiteto, afirmando que é preciso "ser conseqüente até o final".
Até o fim de quem?
Ocorrem-me, diante de Niemeyer, as palavras do poeta português
Antero de Quental (1842-1891) ao responder a um adversário
intelectual: "Levanto-me quando os cabelos brancos de V. Exa. passam
diante de mim. Mas o travesso cérebro que está debaixo e as garridas
e pequeninas coisas que saem dele, confesso, não me merecem nem
admiração nem respeito, nem ainda estima. A futilidade num velho
desgosta-me tanto como a gravidade numa criança. V. Exa. precisa
menos cinqüenta anos de idade, ou então mais cinqüenta de reflexão".
E há Chico Buarque, o terror da propriedade e dos casamentos
privados do Leblon. Sim, a nossa Palas Athena da MPB tem até um
retrato no Museu da Revolução de Cuba, tal é a admiração que lhe
devota o "comandante". O povo prefere Nelson Ned e a novela Escrava
Isaura. Entendo: deve identificar o dono da ilha com Leôncio, o
bandidão senhor de escravos. "Chico", essa entidade acima da moral
e, quiçá, dos bons costumes, faz lirismo voluntário com o sangue
involuntário das vítimas de Fidel. Um talentoso idiota moral.
Boa parte da imprensa não fugiu a esse clima de leniência
(ou "leninência": não resisti ao trocadilho, perdoe-me) com
o "comandante". Sua renúncia assanhou as células do ódio à
democracia e à economia de mercado. Sob o pretexto da isenção,
atribuíram ao facínora uma herança "ambígua". Num rasgo de covardia
intelectual, decretou-se: "Só a história poderá julgá-lo".
Fidel mandou matar em julgamentos sumários 9 479 pessoas. Estima-se
que os mortos do regime cheguem a 17 000. Dois milhões de pessoas
fugiram do país - 15% dos 13 milhões de cubanos. Isso corresponderia
a 27 milhões de brasileiros no exílio. Ele matou 130,76 indiví-duos
por 100 000 habitantes; Pinochet, o facínora chileno, "apenas" 24; a
ditadura brasileira, "só" 0,3. O comandante é 435,86 vezes mais
assassino do que os generais brasileiros, que encheram de metáforas
humanistas a conta bancária de Chico Buarque. A história dirá quem
foi Fidel? Já disse! Permaneceu 49 anos no poder; no período,
passaram pela Casa Branca, lá no "Império" detestado por Niemeyer,
dez presidentes!
Cadê a ambigüidade? A mitologia da resistência é uma trapaça
ideológica a emprestar a homicidas compulsivos a dignidade de
utopistas. Hoje, os nossos "cubanófilos" estão empenhados é em
assaltar os cofres. O problema não está nas duas caras que eles têm,
mas na moral que eles não têm. E é bom lembrar: os ladrões vulgares
não desistiram de solapar a democracia.
Postado por Impunidade > Vergonha Nacional Nacional
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