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Agradeço as oportunas e coerentes intervenções dos comentaristas criticando o proselitismo irresponsável do globoritarismo apoiado pela mídia amestrada banalizando as Instituições e o Poder do Estado para a pratica sistemática de crimes. Os brasileiros de bem que pensam com suas próprias cabeças ja constataram que vivemos uma crise moral sem paralelo na historia que esgarça as Instituições pois os governantes não se posicionam na defesa da Lei e das Instituições gerando uma temerária INSEGURANÇA JURÍDICA. É DEVER de todo brasileiro de bem não se calar e bradar Levanta Brasil! Cidadania-Soberania-Moralidade

10.28.2007

JOÃO UBALDO RIBEIRO


-Bernd, você toma sua cerveja aí e eu fico aqui quieto.

Você não se esqueceu do que aconteceu na Copa? Se não seguram aquele francês, eu hoje no mínimo estaria enterrado no Túmulo do Torcedor Desconhecido.

— O francês? Ele não era besta de tocar a mão em você. Você se esqueceu de seus amigos alemães? Se o francês lhe desse um sopapo, num instante a gente fazia dele um patê, que é, aliás, a única coisa para que francês serve.

— É, mas aí eu mesmo já teria virado panqueca. Não esqueço o tamanho daquele francês, ele devia ser um lutador de sumô disfarçado de francês.

— Vai ver que era, os franceses são capazes de qualquer coisa. Mas aqui não tem nenhum francês, estamos entre amigos alemães.

— O único amigo meu aqui é você.

— Absolutamente! Aqui são todos amigos já conhecem você. Eu falo muito em você. O Schneider até lá leu um livro seu. Schneider, este aqui é o Hans, o escritor brasileiro de que sempre falo a vocês.

— Hans? — É, você aqui é Hans. Ninguém acerta a dizer “João”, de maneira que eu resolvi usar uma tradução simples. Você não quer ser Hans? Se não quiser, vai ter que se acostumar ao pessoal chamar você de Xao. Só quem sabe dizer seu nome aqui sou eu: Djoau, certo? — Certo, certo. Me chame de Hans, Hans é ótimo. Nunca esperei me chamar Hans, adorei Hans.

— Então está ótimo. Pessoal, este aqui é o Hans! Ele vai fazer uma palestra daqui a pouco, veio fazer palestras.

Não é brincadeira, ele no Brasil é o rei da palestra, qualquer coisa ele faz uma palestra, sabe tudo. Então, este é o Hans. Hans, aqui é o Schneider, este aqui é o Friedrich, este é o Joachim, este é o Werner, este é o Dieter, este é o...

Bem, você vai conhecer todo mundo daqui a pouco. E eles estão doidos para saber. O Schneider mesmo, como eu já lhe disse, leu um livro seu e gostou muito, não foi, Schneider? — Gostei muitíssimo. Tive uma certa dificuldade, mas li todo, foi uma grande experiência com a literatura latino-americana.

— Ah, foi difícil, é? Você não entendeu direito? — Bem, na verdade não entendi nada.

Mas foi muito poético, eu não entendia, mas entrava numa espécie de viagem, uma grande viagem. Talvez você não saiba disso, mas nós, alemães, lemos de várias formas e é muito comum a gente aqui ler livros de que não entende nada. Para nós, a leitura pode representar muitas coisas, inclusive não entender nada. Eu mesmo só tenho dois amigos que se meteram a querer entender Hegel, um em Dortmund, cuja mulher não se dá com ele há uns vinte anos, e outro internado num hospício em Dusseldorf. Falta de orientação. Hegel não é para entender, é somente para ler, eles sintonizaram na onda errada.

— Isso não deixa de ser um alívio, porque eu também li e não entendi.

— Normal, normal, você é normal.

O que é que você leu dele? — Bem, algumas coisas. Uma vez, num curso, me obrigaram a ler a Filosofia do Direito.

— Impossível! Na Alemanha, também não há caso de quem tenha entendido a Filosofia do Direito. Fantástico! O Brasil é um país fantástico! Um dia eu vou fazer uma visita. Assim que as coisas acabarem de melhorar, eu vou dar um passeio lá.

— Bem, isso talvez demore um pouco.

— É, eu sei da guerra. Mas essa vocês ganham, mais cedo ou mais tarde, vocês ganham.

— Guerra? Que guerra? — A guerra que a gente vê nos jornais e na televisão. De vez em quando eles mostram a guerra.

— Sim, mas também não é assim, não é bem uma guerra.

— Fantástico! Quer dizer que aqueles blindados, aquelas metralhadoras, o Exército de helicóptero atirando em quem passa lá embaixo, nada disso vocês consideram guerra? Você mora numa zona desmilitarizada? — Não é bem assim. E não é o Exército, é a polícia mesmo.

— Ah, bom, é uma questão técnica, então, terminologia. Guerra para vocês é só quando o Exército entra. Está certo, então não haverá guerra mesmo. Você ouviu isso, Werner? O Hans aqui disse que não há guerra nenhuma no Brasil.

— Bem, deve estar melhorando muito.

O da Silva já deve ter tomado muitas providências, eu tinha certeza de que o da Silva ia acabar com aquilo mesmo.

— Da Silva? — Os brasileiros são realmente fantásticos! Então você não sabe o nome do próprio presidente? — Da Silva... Ah, claro. É, o da Silva...

— O da Silva já disse que está resolvendo tudo e disse que é o melhor presidente da História do Brasil. Ah, o Brasil é realmente um país fantástico! Aquele sol, aquelas praias, aquelas mulheres lindas sempre dispostas, que país! Só não joga mais futebol, mas o da Silva acaba consertando isso também.

Quando o da Silva sair, com tudo resolvido, eu vou morar lá.

— Taí, grande idéia você me deu.

Quando o da Silva sair, se eu ainda estiver vivo, também volto a morar lá numa boa. Algum de vocês aí tem o telefone do serviço de imigração daqui da Alemanha? 


JOÃO UBALDO RIBEIRO
é escritor.

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